Foto de Ana Paula Martins
Ana Paula Martins

Formada em Publicidade e Propaganda; MBA Marketing Branding e Growth

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Entrando no Feeling com Vale Tudo: narrativa, publicidade e o Brasil como palco

Entrando no Feeling com Vale Tudo: narrativa, publicidade e o Brasil como palco

Como a Globo transformou uma história dos anos 80 em um fenômeno de marca em pleno 2025

Em 2025, o Brasil parou mais uma vez diante da pergunta que atravessou décadas: “Quem matou Odete Roitman?”. A icônica novela Vale Tudo, exibida originalmente em 1988, voltou às telas em um remake moderno e se transformou em um fenômeno não apenas de audiência, mas de branding, estratégia e cultura popular.

Mais de 287 milhões de interações nas redes sociais, 23 marcas patrocinadoras, 20 eventos públicos de exibição e um faturamento estimado de R$ 200 milhões. A reestreia de Vale Tudo não foi apenas uma novela, foi uma experiência transmídia que colocou o Brasil como palco e a emoção como protagonista.

Mas o que faz um conteúdo de mais de 30 anos continuar relevante? E o que o marketing pode aprender com isso?

Neste “Entrando no Feeling”, vamos analisar o caso de Vale Tudo como uma aula de narrativa estratégica, integração publicitária e resgate afetivo coletivo, ingredientes que qualquer marca pode estudar para aplicar.

O Brasil como protagonista

Desde a sua primeira versão, Vale Tudo sempre foi mais do que entretenimento. Escrita por Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères, a novela levantava questionamentos sobre ética, ambição, desigualdade e as contradições da sociedade brasileira. A pergunta central, “Vale a pena ser honesto no Brasil?”, ecoa até hoje.

Trazer essa narrativa de volta em 2025 foi um acerto que uniu timing, nostalgia e relevância política. A Globo entendeu que, em meio a polarizações, redes sociais fervilhando e escândalos em pauta, o público precisava, e queria, revisitar esse debate.

Mais do que atualizar o figurino ou a linguagem, o remake fez o Brasil se ver. E quando o público se reconhece na tela, a conexão é inevitável.

Storytelling com estratégia: o valor de uma boa trama

Se há algo que Vale Tudo ensina ao marketing é o poder de uma narrativa bem construída.

Toda marca quer ser lembrada. Mas poucas constroem um enredo capaz de capturar emoção, gerar discussão e criar pertencimento. A novela fez isso com:

  • Personagens com conflitos reais e múltiplas camadas;
  • Uma pergunta central que provocava reflexão;
  • Um final enigmático que estimulava o engajamento e o boca a boca.

Marcas que desejam impactar precisam aprender com esse tipo de estrutura. Não basta apresentar um produto. É preciso contar uma história que o público queira acompanhar, e mais do que isso, participar dela.

Marcas que entram no enredo, não só no intervalo

Um dos diferenciais da nova Vale Tudo foi a forma como as marcas participaram da experiência: integradas à trama, e não apenas à publicidade de intervalo.

Foram pelo menos 23 marcas patrocinadoras, incluindo nomes como O Boticário, Claro, Natura e PicPay, que apareceram tanto nos breaks quanto em ativações especiais, figurinos, produtos de cena e ações nas redes.

Esse modelo vai muito além do tradicional product placement. É o que chamamos de branded content contextualizado: quando a marca não apenas aparece, mas conversa com o enredo, amplia o alcance da história e entrega valor ao público.

Exemplo? A Natura, que associou seu propósito de diversidade e cuidado à narrativa de personagens femininas fortes e complexas. Ou o PicPay, que utilizou elementos da novela para gerar conversas no X (Twitter) com memes, cupons e desafios interativos.

A Globo criou um ambiente onde as marcas atuam como personagens secundários da trama, relevantes, coerentes e memoráveis.

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Quando o entretenimento vira estratégia omnichannel

Vale Tudo não aconteceu apenas na TV. Ela foi uma experiência multicanal cuidadosamente orquestrada:

  • Mais de 287 milhões de interações nas redes sociais;
  • 20 eventos públicos de exibição com telões, ativações e participação de elenco;
  • Podcasts, newsletters e conteúdo exclusivo com bastidores;
  • Merchandising online e físico com camisetas, cadernos, copos e até perfumes temáticos.

Isso é entertainment as a service. E também é marketing.

A novela virou um ecossistema de conteúdo que impulsionou marcas, vendeu produtos e construiu relevância além da telinha.

Não se tratou apenas de audiência. Se tratou de presença.

O valor do afeto e da memória coletiva

Por fim, não podemos ignorar a força do afetivo. Vale Tudo é uma novela que mora no imaginário nacional. Trazer de volta seus personagens e dilemas foi mais do que entretenimento, foi tocar em memórias que o brasileiro guarda com carinho.

Marcas que conseguem fazer isso, ativar lembranças, emoções e valores, saem do lugar comum e entram no território do simbólico.

E nesse lugar, a disputa não é mais por preço ou visibilidade, mas por vínculo.

Um roteiro de R$ 200 milhões: publicidade com cara de cultura

A retomada de Vale Tudo em 2025 mostrou que entretenimento e publicidade não precisam ocupar lados opostos da mesa. Ao contrário, quando bem alinhados, criam um valor simbólico e comercial que extrapola o conteúdo em si.

Segundo a matéria da Exame, a novela movimentou cerca de R$ 200 milhões em ações comerciais, não por vender espaços publicitários comuns, mas por oferecer uma plataforma viva de engajamento, afeto e relevância social.

E isso nos ensina algo precioso:
O público quer conexão. As marcas que entregam isso, faturam.

O case por trás dos bastidores: o planejamento estratégico

Por trás da explosão de audiência e faturamento, houve uma série de decisões estratégicas que sustentaram o projeto. Podemos destacar:

1. Escolha do momento certo

Revisitar Vale Tudo em 2025 foi um acerto de timing. Em um Brasil marcado por escândalos políticos, redes sociais fervilhando e crises de reputação, a novela encontrou eco.

Timing não é sorte. É leitura de contexto.
E toda marca precisa desenvolver essa escuta ativa do seu tempo.

2. Curadoria das marcas patrocinadoras

Os parceiros comerciais da novela não foram escolhidos apenas por orçamento, mas por afinidade com os temas e com os valores centrais da narrativa. Isso criou uma sensação de coerência e respeito à obra, o que, por consequência, fortaleceu também as marcas envolvidas.

3. Ativações multiformato

Cada marca teve espaço para se expressar de maneira criativa e conectada com a história. Algumas entraram como ações digitais, outras por figurino, cenografia, trilhas ou storytelling nas redes.

Foi o oposto de uma publicidade intrusiva. Foi publicidade que somou valor à experiência cultural.

A novela virou marca

Sim, Vale Tudo virou uma marca.
E como toda marca forte, ela tem:

  • Um propósito claro (questionar os limites da ética na sociedade brasileira);
  • Um tom de voz próprio (crítico, atual, envolvente);
  • Um posicionamento reconhecível (um espelho do Brasil real);
  • Uma comunidade engajada (milhões de brasileiros discutindo, opinando, se emocionando).

O branding não está restrito a empresas. Está em toda experiência que entrega valor, consistência e emoção.

A Globo soube tratar a novela como um ativo de marca, e o público comprou a ideia.

E o que a sua marca pode aprender com Vale Tudo?

A essa altura, você pode estar se perguntando:
“Ok, mas minha empresa não é a Globo nem tem uma novela com audiência nacional. O que isso tem a ver comigo?”

Tudo.

Porque, no fim das contas, estamos falando de pilares que servem para qualquer marca, de qualquer porte. Veja alguns deles:

• Narrativa é mais poderosa que argumento

Histórias engajam, emocionam e permanecem. Não tente apenas convencer com lógica. Conquiste com significado.

• Cultura vende mais que o produto

Quando sua marca participa da conversa cultural, ela deixa de ser apenas uma vendedora de algo e passa a ser um símbolo. Marcas símbolo têm defensores, não apenas compradores.

• Experiência vale mais que alcance

A novela não só foi vista, ela foi vivida. Quando sua empresa cria uma jornada memorável, mesmo com menos mídia, o retorno é mais forte e duradouro.

• Posicionamento é tudo

Você sabe exatamente onde sua marca quer estar? Quais valores ela representa? O que ela provoca no público?
Se não sabe, você ainda não tem um posicionamento.

As marcas que entraram no palco (e brilharam)

Entre as 23 marcas envolvidas com a novela, algumas se destacaram por entender o papel cultural da obra:

  • Natura: fez ativações ligadas à diversidade e ao empoderamento feminino, alinhando seus pilares ESG com os arcos narrativos das personagens.
  • PicPay: apostou na gamificação com desafios interativos nas redes sociais inspirados na novela, gerando cupons e conversas espontâneas.
  • Vivo: usou o mote “conexão é tudo” para vincular cenas da novela com ações de conectividade real entre os brasileiros, incluindo projeções em telões pelo país.

Esses exemplos mostram que é possível vender sem interromper. E sim, vender mais, porque não interrompe. Conecta.

E se sua marca fosse uma novela?

Essa talvez seja a pergunta que fecha este “Entrando no Feeling” com chave de ouro.

Pense:

  • Qual seria o enredo da sua marca?
  • Quem seriam os protagonistas e antagonistas?
  • Qual seria a emoção que atravessa os capítulos?
  • O público se veria nessa história?

Marcas que sabem o que estão narrando têm mais chances de serem seguidas, defendidas e amadas.

Em um mercado onde a disputa por atenção é brutal, contar uma boa história é mais eficaz que gritar uma oferta.

Branding com roteiro, emoção com estratégia

Vale Tudo nos mostrou que até os formatos mais clássicos, como a novela das 9, podem ser atualizados com maestria quando se unem conteúdo, propósito, experiência e estratégia de marca.

É esse o futuro do marketing:

  • Mais imersão
  • Menos exposição
  • Mais conexão

E para chegar lá, vale tudo?
Só se for com alma, propósito e um roteiro bem escrito!

Fontes: